Tem tanta coisa acontecendo no mundo ao mesmo tempo que às vezes é uma tarefa hercúlea (até impossível) ficar a par de tudo, mas a Fearless quer te ajudar, e ao mesmo tempo te entreter: abaixo, reunimos séries e filmes que abordam questões LGBTIA+ em que você deveria se inteirar.
10. “Tangerina” (2015)
Notável por sua energia caótica, pelas performances genuínas de um elenco quase inteiramente transgênero (Mya Taylor, em especial, é um pequeno milagre em tela), e pela proficiência técnica que tira de sua filmagem em iPhones, “Tangerina” é também um retrato honesto do dia-a-dia de pessoas trans que recorrem à prostituição para sobreviver. Sem desdenhar, romantizar ou espetacularizar a atividade profissional de suas protagonistas, o filme de Sean Baker, ao invés disso, ilumina tanto as facetas de perigo e humilhação quanto as de comunidade e alegria que elas encontram por seus caminhos de vida.
09. “O Mau Exemplo de Cameron Post” (2018)
Esqueça “Boy Erased”, o filme que mais famosamente lidou com a terapia de conversão (a popular - e infernal - “cura gay”) nos anos recentes. Lançado quase simultaneamente a ele, “O Mau Exemplo de Cameron Post” lida com o tema com muito mais contundência, mais sensibilidade e, muito importantemente, mais diversidade. As histórias díspares que se juntam ao redor da protagonista, Cameron (Chloë Moretz, excelente), no acampamento de conversão, são de quebrar o coração, mas também inspiradoras em sua não finalidade. “Cameron Post” posiciona, em seu retrato preciso de uma crueldade inimaginável, que o mundo pode nos tirar muita coisa - mas não é capaz de esmagar nosso espírito quando estamos em comunidade.
08. “Boca a Boca” (2020)
A melhor original brasileira da Netflix até hoje, “Boca a Boca” chegou em um momento em que é impossível não relacionar a sua trama (a proliferação de uma doença transmitida pelo beijo pela comunidade jovem de uma cidade pequena no interior) à pandemia do coronavírus. Mas é redutivo pensar na criação de Esmir Filho como meramente um pedaço profético de ficção - a série é também um retrato corajoso e tocante do conflito entre gerações que leva os mais velhos a patologizar comportamentos e identidades que não eram plenamente entendidas até pouco tempo atrás. E isso inclui, é claro, os vários personagens LGBTIA+ da produção.
07.“Tatuagem” (2013)
O filme de Hilton Lacerda se passa na ditadura militar, mas parece alarmantemente atual se visto hoje, sob um governo (ou melhor, sob alguns governos, em nível local e nacional) que já demonstrou que seu comprometimento com a liberdade de expressão é frágil, na melhor das hipóteses, especialmente quando identidades LGBTIA+ estão envolvidas. “Tatuagem” explode em expressividade e brasilidade, desbravando o contexto da censura ao mesmo tempo em que constrói uma história de amor vibrante que parece dizer: você pode nos tirar dos palcos, mas não do mundo - e, definitivamente, não da arte como um todo.
06.“The Bisexual” (2018)
Pessoas bissexuais frequentemente vivem uma realidade, dentro e fora da comunidade LGBTIA+, que inclui contestação infindável de sua identidade por terceiros, exclusão rotineira de discussões fundamentais para a sua sobrevivência, descaso institucional e acadêmico que impede que sejam consideradas dentro do ativismo por avanço de direitos LGBTIA+, e muitos outros problemas que são únicos a elas e raramente vistos na TV ou no cinema. A série “The Bisexual”, da cineasta bi Desiree Akhvan, corrige um pouco disso com uma narrativa cheia de insight e importância social, mas também deliciosamente bem humorada e humana.
05.“Gaycation” (2016)
Essa série documental do Vice é frequentemente subestimada como uma espécie de “cinema cartão-postal” para espectadores LGBTIA+ - mas a intervenção precisa dos apresentadores Ian Daniel e Elliot Page garante que cada episódio seja, além de um deleite turístico, uma avaliação séria dos direitos de pessoas queer no local e na época em que eles aportam. O episódio no Brasil, em que Page tem um encontro tenso e confrontador com Bolsonaro, ficou famoso por bons motivos, mas vale também conferir os capítulos especiais produzidos logo após o tiroteio na boate Pulse, em Orlando, e após a eleição de Donald Trump para a presidência dos EUA.
04.“Moonlight” (2016)
Em um ano como 2020, em que o canto de “vidas negras importam” ecoou por todo o planeta, mais forte do que nunca, “Moonlight” se coloca como obra ainda mais crucial para se posicionar socialmente no mundo. O filme de Barry Jenkins (e de Tarrell Alvin McCraney, o homem gay negro que criou a história e os personagens) interpreta as intersecções entre identidades raciais e sexuais como nenhuma outra, traduzindo em poesias visuais e discursivas oblíquas, que se enroscam no coração do espectador, tanto o dilema social quanto a vibrante, exultante experiência de amor que envolve as pessoas que retrata.
03.“Filadélfia” (1993)
“Filadélfia” é o filme mais antigo nesta lista, tendo chegado aos cinemas em 1993 - o que faz com que seja ainda mais revoltante a atualidade e urgência de sua história, sobre um homem (Tom Hanks) que é demitido da firma de advocacia onde trabalha quando se descobre que ele é gay e HIV positivo. O retrato da AIDS “sanitizado” no filme recebeu e ainda recebe (com certa justiça) muitas críticas, mas o aspecto judicial da batalha do protagonista contra a discriminação no mercado de trabalho é tão importante quanto, e envelheceu consideravelmente melhor.
02.”Disclosure” (2020)
Embora separados por 25 anos (um é de 1995, e outro de 2020), “The Celluloid Closet” e “Disclosure” formam um díptico essencial para entender a luta por representação LGBTIA+ na mídia, a sua importância e a história dela até hoje. Enquanto o primeiro analisa retratos de pessoas gays e lésbicas no cinema desde o advento de Hollywood, o segundo joga uma necessária luz sobre o tratamento de personagens transgênero nos mesmos contextos. Material histórico de primeira qualidade, e suma importância.
01.“Quebra-Mar” (2019)
A experiência lésbica brasileira é representada em uma mistura impressionante de poesia e documentário no curta-metragem de Cris Lyra, que se desdobra em expressões musicais, visuais e conversacionais para destrinchar o universo de um grupo diverso de mulheres que amam mulheres, reunido para uma festa de ano novo. É um olhar valioso, amplo e generoso a um grupo cujas reivindicações e interesses são frequentemente marginalizados dentro de um movimento LGBTIA+ que pode se mostrar, em certos momentos e certos cantos, cruelmente misógino.
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